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domingo, 22 de novembro de 2015

Liberdade de expressão x expressão da liberdade


A demissão ocorrida recentemente do jornalista e apresentador Sidney Rezende, pela Globo News, ‘coincidentemente’ um dia após ele ter tecido, através de seu blog pessoal, fortes críticas à grande mídia e, especialmente, ao bombardeamento permanente desta contra o governo, traz à tona, a discussão em torno da polêmica trilogia: liberdade de expressão, censura e regulação da mídia. Mais que isso, nos põe a refletir novamente acerca da dicotomia acerca da liberdade de expressão x expressão da liberdade.

Com exceção do ‘pior cego’ - aquele que insiste em não querer enxergar o que está a um palmo de seu nariz -, o ato de demissão,  vale dizer, justificado pela empresa como sendo uma medida de reestruturação do seu quadro jornalístico, é mais uma demonstração inequívoca da censura velada exercida pelo sistema Globo de Comunicação e, vale ressaltar, pelos demais grupos oligárquicos de comunicação aos seus funcionários que são impedidos de manifestarem-se ideologicamente contrários ao que apregoa o ‘bom’ e velho manual de instrução dos donos da mídia.

Essas mesmas empresas que, insistem em confundir a opinião pública quando o assunto é regulação da mídia, rotulando-a enquanto um ato de controle e censura, contrário à liberdade de imprensa. Trata-se aqui, de uma estratégia maquiavélica que vem sendo usada, fundamentada, sobretudo, no sinônimo entre os termos ‘controle’ e ‘regulação’. Pois bem, nesse sentido, vale aqui alguns breves esclarecimentos.

Apesar de que filólogos como o brasileiro Antonio Houaiss definam a palavra “controle” como sinônimo de “regulação” – por esse motivo é que se fala de “controle social”, “controle constitucional”, “controle democrático”, o mesmo ocorre com o vocábulo “regulação”, associado ao estabelecimento de regras, leis, regimes institucionais que, se constituídos em um sistema democrático, não poderiam ser considerados autoritários. A regulação democrática ou a regulação dentro dos princípios do Estado Democrático de Direito são alguns dos pleonasmos utilizados para deixar claro que o objetivo de determinada política reguladora não consiste em estabelecer uma prática de censura dos meios de comunicação.

Assim, por exemplo, as práticas de regulação daqueles conteúdos televisivos que podem atentar contra os direitos das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos grupos religiosos, das classes econômicas menos favorecidas ou das pessoas com deficiência, entre outras minorias políticas, não parece caber no sentido atribuído à palavra “censura” – já que tais medidas buscam aprofundar a ideia central de pluralidade de vozes e visões, vital para as democracias. O mesmo ocorre, por exemplo, com o direito de resposta na mídia quando o cidadão se sentir moral e injustamente ofendido, medida esta, aliás, de um Projeto de Lei que depois de anos tramitando no Congresso, foi aprovado e sancinado pela Presidência da República no último dia 14 de novembro, embora com restrições polêmicas (ver mais no link: http://ultimosegundo.ig.com.br/politica/2015-11-04/senado-aprova-lei-que-regulamenta-direito-de-resposta-na-midia.html ).

Afora isso, como esclarecem as diversas entidades que lutam em defesa da regulação democrática da mídia, dentre elas, o Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, FNDC, e a ANDI – comunicação e direitos, a percepção contemporânea de que os meios de comunicação são instituições centrais para os regimes democráticos garantiu a esses meios, por parte dos Estados Nacionais, um conjunto de direitos especiais que têm sua mais importante expressão no direito à liberdade de imprensa, o que representou um avanço significativo na história da democracia. Por outro lado, esse mesmo reconhecimento e o fato de serem definidos como direitos especiais levaram os Estados Nacionais a estabelecerem um conjunto de regras que ressaltam os deveres da mídia em relação às nossas democracias, algo que, entretanto, vem sendo duramente rechaçado pelos grupos oligárquicos midiáticos detentores de grande influência junto ao Poder Público em todas as suas esferas. Além do mais, Não é de hoje que os Estados vem assumindo a decisão de estabelecer normatizações sobre a atividade privada – nem tais regramentos estão limitadas ao campo da comunicação.

Portanto, voltando ao caso específico da demissão de Sidney Silvestre, como se pode ver, para além da defesa de um direito constitucional e de interesse de toda a sociedade brasileira, a regulação da mídia também ajudará na garantia do direito específico dos profissionais de imprensa que trabalham e vivem permanentemente sob a terrível ameaça da amordaça apregoado veladamente pelo direito escuso da liberdade de empresa. É por essas e outras mais que a sociedade brasileira necessita urgentemente se mobilizar pelo direito pleno à comunicação, um dos pilares do autêntico Estado de Direito Democrático.

domingo, 11 de janeiro de 2015

O polêmico direito à liberdade de expressão

O fatídico e lamentável episódio do atentado contra a revista humorística francesa Charlie Hebdo reacende uma das mais polêmicas discussões que repercute no mundo contemporâneo que é liberdade de expressão. Depois de muita reflexão, seja na qualidade de jornalista, professor da área de Comunicação Social, cientista social e, sobretudo, cidadão, fui paulatinamente construindo o meu ponto de vista acerca do tema em questão até me sentir seguro o bastante para falar a respeito, coisa que o faço pela primeira vez nesse artigo,o mesmo que me faz retornar à blogosfera, depois de uma longa pausa compulsória.  

E a conclusão a que cheguei,sobretudo, depois de ler diversas opiniões a respeito do tema desencadeado a partir desse episódio destacado pela imprensa do mundo inteiro é a de que, realmente ao que me parece, ainda existe uma certa confusão conceitual, de natureza perceptiva em torno do que denominamos de liberdade, liberdade de expressão e liberdade de imprensa. Trata-se aqui de uma confusão até certo ponto natural, se levarmos em consideração a falta de consenso existente até os dias de hoje em torno de cada um desses três atos de direito civis, conforme veremos a seguir.

A falta de entendimento comum, ou seja, consenso, se dá inicialmente a partir da diversidade conceitual em torno do significado da liberdade. O ‘desentendimento’ se inicia já a partir dos diferentes e por vezes, distintos, pontos de vistas apresentados por alguns dos pensadores da Filosofia Clássica, campo em que a liberdade sempre foi amplamente discutida. Basta citar, por exemplo, que, enquanto para Sartre, o filósofo do existencialismo, a liberdade representa a condição ontológica do ser humano, ou seja, o homem é antes de tudo, um ser livre, para Schopenhaur, a ação humana não é totalmente livre e está condicionada a níveis de objetivação de sua vontade. Para esse, o homem nem sempre é livre para deliberar sobre sua vontade. Dito de outra forma, vemos aqui uma diferença entre a liberdade vista sob o ponto de vista ontológico, natural, e a mesma vista sob um prisma mais, social, ou diríamos,  sociopolítico.

Dentro de uma leitura mais simplificada ou simplista, tendo em vista que trata-se aqui de uma visão de um leigo na Filosofia, diria que ambos os pensadores apresentam visões corretas e interessantes, tendo em vista que, do ponto de vista das leis naturais, podemos afirmar que nascemos todos seres livres, dispostos a gozarmos de uma liberdade plena, ilimitada. Porém, do ponto de vista regido pelas leis sociais, humanas, nos tornamos seres relativamente livres, uma vez que não somos ‘donos’ de nossas vontades. Essas, passam a ser legisladas pelo direito civil que, por sua vez, tentam nos garantir o direito às mais diversas formas de liberdade, como liberdade de expressão, liberdade de pensamento, liberdade religiosa, etc.

Adentrando no campo da noção acerca dos dois outros elementos, nos deparamos com uma confusão, talvez ainda maior, gerando, muitas vezes, uma certa dicotomia entre liberdade de expressão x liberdade de imprensa. Trata-se aqui, vale salientar, de uma confusão que nasce, de um lado, de forma natural e respaldada numa dificuldade de entendimento conceitual acerca das de cada uma dessas modalidades de liberdade e, de outra, de forma intencional, ou seja, movida de alguma forma pelo interesse de confundir propositadamente a opinião pública, visando outros interesses que não especificamente o direito amplo à liberdade.

Ao contrário do que querem que pensemos, apesar de próximos um do outro, liberdade de expressão e liberdade de imprensa não são direitos similares. No primeiro caso, temos o direito à informação e liberdade de expressão que são direitos dos cidadãos, cláusulas pétreas da constituição. Já a liberdade de imprensa, diz respeito a um outro tipo de direito. Trata-se aqui de um direito acessório das empresas jornalísticas, ou seja, uma determinada modalidade de direito que só se justifica se utilizado para o cumprimento correto da missão constitucional que lhe foi conferida, ou seja, trabalhar a informação de caráter social, de interesse público, voltada para o bem comum dos cidadãos (?!).

Dentro desse contexto, portanto, podemos tirar uma série de conclusões. Algumas felizes, outras nem tanto. Uma das felizes é a de que, através do direito à informação e liberdade de expressão de que constitucionalmente lhe é garantido, pode qualquer cidadão se informar e se expressar através de todo e qualquer meio de comunicação, socializando dessa forma, o seu pensamento, a sua visão de vida, de mundo e acerca de temas ou acontecimentos específicos que lhes são de seu interesse. E que, assim sendo, é natural que ele possa se valer dos mais diversos meios de comunicação social, especialmente, a imprensa, para não apenas se informar mas, também expressar-se. E, ai, como sabemos, nos deparamos com uma das conclusões infelizes, pois trata-se aqui de uma das liberdades mais restritas de que sofre o cidadão na sociedade atual, mesmo entre aquelas que se autoproclamam gozando de pleno estado democrático de direito, como a nossa.

Eis uma realidade que, apesar de amenizada com a chegada e progresso da internet e especialmente, das redes sociais, no tocante ao universo da imprensa, ainda deixa muito a desejar. Recentemente, ao realizarmos um trabalho de pesquisa crítico-analítico sobre o espaço concedido pelos órgãos de imprensa aos sujeitos receptores, eu e alguns de meus alunos averiguemos que não só há uma defasagem de espaço aberto para esses, como houve uma redução considerável desse espaço nos jornais impressos da imprensa paraibana.

Por fim, para não me alongar demasiadamente nesse que, como vemos, é um tema pra lá de instigantes, e voltando ao episódio envolvendo a revista francesa Charlie Hbdo, penso que se faz importante e cada vez mais urgente, refletirmos de maneira mais aprofundada acerca do que denominamos como sendo um ataque à liberdade de expressão, liberdade de imprensa, afim de não confundirmos, como querem os donos dos conglomerados da mídia em todo o mundo, coisas como: marco regulatório da comunicação com censura e, por outro lado, liberdade de imprensa com direito de ataque à liberdade religiosa, um outro tipo de extremismo tão perigoso e fatal quanto o que gerou o lamentável e inaceitável atentado terrorista.